Houve um silêncio ensurdecedor no Maracanã no dia 16 de julho de 1950, escreveu Nelson Rodrigues.
O escritor referia-se ao golo de Ghiggia, autor do segundo golo do Uruguai 2-1 sobre o Brasil na final do Campeoanto do Mundo – no Maracanã.
O mesmo Ghiggia que diria mais tarde a frase: “Apenas três pessoas, com um único gesto, calaram o Maracanã: Frank Sinatra, o Papa João Paulo II e eu”.
O Brasil era considerado favorito, tinha goleado a Suécia 7-1 e a Espanha 6-1 nas partidas anteriores e jogava a final a precisar apenas de um empate (a segunda e última fase jogava-se numa classificação entre 4 seleções: Uruguai, Brasil, Suécia e Espanha).
Classificação a uma jornada do fim:
1. Brasil 4
2. Uruguai 3
3. Espanha 1
4. Suécia 0
Brasil-Suécia 7-1
Uruguai-Espanha 2-2
Uruguai-Suécia 3-2
Brasil-Espanha 6-1
A seleção da casa contava com o apoio de 200 mil adeptos (os números oficiais dão 173.850 pagantes, mas os relatos dizem que havia mais gente nas arquibancadas).
Estava tudo pronto para a festa.
Tudo menos, claro, os uruguaios liderados pelo super capitão Obdulio Varela.
O Brasil marcou primeiro por Friaça. O pior (na óptica do brasileiro) veio a seguir. Os 13 minutos que mudariam para sempre a história brasileira (social, cultural e desportiva).
- Juan Schiaffino empatou aos 66
- Alcides Ghiggia fez o 2-1 aos 79
Classificação final:
1. Uruguai 5
2. Brasil 4
3. Suécia 2
4. Espanha 1
Uruguai-Brasil 2-1
Suécia-Espanha 3-1
Eis a Anatomia de uma Derrota se quisermos pegar no livro de Paulo Perdigão.
O país entrou em colapso, ganhou complexo de vira-lata, esse sentimento de inferioridade cunhado por Nelson rodrigues.
O Brasil só se recuperaria do choque (pelo menos no campo futebolístico) em 1958, quando ganhou o Mundial pela primeira vez – mas o fenómeno de vira-lata ou vira-latismo acentuou-se numa nação com pouca auto-estima.
Para Rodrigues, o fenómeno não se limitava ao campo futebolístico:
«Por ‘complexo de vira-lata’ entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima»
Parecia o fim de um sonho.
Para muitos brasileiros nunca mais o país venceria um Mundial. Ao contrário do Uruguai: festejou no Rio de Janeiro o seu bicampeonato, tinha vencido o primeiro de todos em 1930, eram bicampeões olímpicos em 1924 e 1928, em Paris e Amsterdão.
Mas deu-se o inverso.
Depois do Maracanazo o Brasil mudou de camisola, deixou o branco “inexpressivo” e a federação brasileira (CBF) abriu um concurso para a nova indumentária: venceu Aldyr Schlee, um brasileiro nascido na fronteira com o Uruguai (e que contava não ter ficado triste com o triunfo uruguaio na final de 1950).
Schlee escolheu o amarelo-ouro para a camisola e o azul-cobalto para os calções. Não eram as tonalidades da bandeira mas o seu desenho foi o escolhido.

Com essa camisola amarela foi o que se viu: o Brasil conquistaria cinco Mundiais e é a seleção com mais títulos. Todo o mundo tenta só o Brasil é penta.
E o Uruguai não voltou sequer a disputar uma final de um Campeonato do Mundo.